terça-feira, 18 de janeiro de 2011

vivemos pior do que há 40 anos?

Não passa de uma mera sondagem de opinião.
Não levanto a possibilidade de argumentar a respeito da amostra utilizada (1000 inquéritos) como sendo demasiado curta para um universo tão vasto.
O Projecto Farol é um autêntico think thank da Consultora Deloitte que realizou um estudo sociológico com o objectivo de perceber as perspectivas que os portugueses têm em relação ao seu país.
Uma certeza: a qualidade de vida piorou desde o 25 de Abril. Ou seja, segundo o estudo realizado, vive-se, actualmente, pior em Portugal do que há 40 anos.
Sem dúvida que, apesar do nosso epíteto de "povo de brandos costumes", somos igualmente herdeiros do Fado. Não da canção (que é bem nosso) mas acima de tudo do sentimentalismo, da tragicidade, do pathos e da saudade (palavra tão só nossa)...herdeiros do Velho do Restelo camoniano.

Vivemos pior do que há 40 anos?

Outra coisa que nos define enquanto portugueses é a pouca durabilidade da nossa memória colectiva. 
Em 40 anos, muito se evaporou de tempos bafientos. Politicamente, a Democracia (com todas as suas imperfeições) instalou-se em Portugal. É-nos muito fácil sacudir a água do capote, responsabilizando terceiros pelo melodrama em que a nossa vida se tornou. 
Somos politicamente incultos e, por vezes, esperamos que a Democracia actue por nós, em vez de actuarmos nós de forma a melhorar a Democracia. Porque a Democracia não se esgota no hemiciclo de S.Bento, nem os líderes partidários são intocáveis primas donnas guardiães do espírito democrático. Se a Democracia, como sistema de organização política e social, nasceu há 2500 anos na Grécia, nós hoje esquecemo-nos do que a palavra em si representa.
A Política é, para os clássicos pensadores, para ser exercida pela Polis, para ser pensada por toda a comunidade. 
É isto a participação cívica.É isto que nos falta enquanto povo!
O estudo hoje revelado indica que a desconfiança em relação à elite política é quase total: 94% dos inquiridos atribuem aos políticos a responsabilidade pelo mal-estar que vivemos
Mas quando eu leio os comentários de opinião por esses sites e jornais a fora, e quando me aparecem presumíveis mentes iluminadas que, de forma majestosa, afirmam que não votam porque não acreditam nos políticos, apenas contribuem para que as coisas se mantenham como estão.

Vivemos pior do que há 40 anos?

Vivemos. Vivemos porque nos demitimos do nosso sentido cívico. Os Portugueses, por incrível que pareça, que iniciaram a descoberta dos mares, adoram sentir chão firme e terra dura. A geração dos meus pais vivia na certeza do pleno emprego, de um estado que oferecia garantias. Os preços oscilavam pouco e, com maior ou menor difculdade, vivia-se habitualmente sem grandes distúrbios. 
Mesmo não tendo vivido esses tempos, acredito que nem toda a gente tinha comida na mesa à hora do almoço e à hora do jantar. Nem toda a gente tinha uma casa com todas as mordomias: água quente, gás canalizado, TV por cabo, Internet e toda a oferta de consumo que hoje temos em nosso redor.


Vivemos pior do que há 40 anos?

Hoje a nossa mundividência é maior. Quase que conhecemos o mundo sem sair dos poucos metros quadrados da nossa casa. Se sairmos, temos um carro à porta, transportes públicos, as nossas perninhas com força suficiente para nos mexermos. E se as nossas perninhas são saudáveis, é porque temos melhores cuidados de saúde. As crianças nascem menos, é verdade, mas nascem melhor. Não sofremos, por isso, o horror de as perdermos. E essas crianças um dia terão todas as possibilidades de se tornarem alguém: têm escola, têm actividades físicas e culturais... podem jogar à bola na rua...ou no conforto do sofá...


Vivemos pior do que há 40 anos?

Se calhar a nossa economia é frágil. Mas aí atribuo como responsáveis os senhores que nos quiseram fazer acreditar na possibilidade de termos tudo isto de forma ilimitada. E um deles prepara-se para no próximo Domingo iniciar o seu segundo mandato como presidente da República! A Europa abriu-nos portas inimagináveis há 25 anos atrás. Os mecanismos para que consumíssemos maravilharam-nos. A confiança de Portugal fortaleceu-se pois, apenas à distância de uma assinatura e da passagem do cartão de crédito pelo leitor magnético, poderiamos adquirir bens que nos enchiam o ego e nos davam mais qualidade de vida.
O crescimento económico português foi um crescimento baseado numa prosperidade deveras fragilizada.
Hoje somos mais uns no meio de uma aldeia global! Concorremos com países e economias que nem sabemos onde ficam geograficamente! E sentimos isso no dia-a-dia...

Vivemos pior do que há 40 anos?

A Globalização era inevitável. E é irreversível! Assumo que tem factores negativos mas tem igualmente factores positivos: era impensável há uns anos adquirir artigos inexistentes em Portugal sentadinho confortavelmente aqui neste mesmo sítio de onde vos escrevo. A Internet ligou-nos ao mundo e alterou irreversivelmente os nossos hábitos culturais. A loja física é ultrapassada por uma loja virtual. Mas o que interessa é que os artigos chegam cá a casa. Vêm da Inglaterra, da Austrália, da América do Sul e dos EUA! De todo o lado!
Os portugueses têm medo das areias movediças destes novos tempos. Vivemos tempos em que não vivemos mas sobrevivemos. Adaptamo-nos e voltamos a nos readaptar uma vez, e outra vez e mais uma vez. Esta é a nossa oportunidade mas continuamos à espera que façam tudo por nós pois "eles", o "Estado-Papão" é que tem a obrigação de nos criar as melhores condições.
Pois pagamos cada vez mais impostos, atiramos pedras a todos os que são dados como presumíveis corruptos quando nós, como povo, somos os primeiros, à primeira oportunidade, a passarmos à frente na fila para o metro à chico esperto!
E deverá ser o Estado a dar-nos um ralhete na altura em que fazemos mais um crédito ao consumo quando já não temos disponibilidade orçamental para tal!
Chateia-nos o facto de os preços aumentarem e de não conseguirmos realizar as viagens de sonho ou adquirir o carro X ou Y. E isso leva-nos a acreditar que vivemos actualmente pior do que em 1970, quando nessa altura os nossos horizontes terminavam ali ao fundo da rua.
Ainda hoje numa aula disse aos alunos que nós muitas vezes utilizamos a palavra "felicidade" de uma forma desmesurada e demasiado gratuita. A "Felicidade" é para nós o derradeiro fim e bem longínquo. Mas cabe-nos a nós trilhar o caminho para lá podermos chegar.


A pergunta que volto a colocar...

Vivemos pior do que há 40 anos?

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