quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

das presidenciais

Qual a razão de ser do Presidente da República Portuguesa?
Ao contrário dos sistemas presidencialistas americano e francês, em que o Presidente tem papel activo na gestão de cada país, em Portugal a situação é bastante diferente.
Os poderes institucionais da Presidência da República são bastante limitados: é a mais alta figura de Estado, representando o país como alguém escolhido directamente pela soberania nacional. 
A origem da figura do Presidente da República encontra-se ainda nos primeiros tempos do Liberalismo em Portugal. Em 1826, o rei (que nunca o chegaria a ser) D.Pedro IV elabora a Carta Constitucional de forma a garantir à sua filha D.Maria da Glória um autêntico manual de sobrevivência política. A Carta Constitucional representou a tentativa de achar um consenso entre as esferas tradicionalistas e progressistas da vida política portuguesa; os defensores de uma monarquia tradicionalista em que a figura do monarca continuaria a ser relevante e uma elite pró-liberal, crítica em relação à organização estratificada da sociedade.
Apesar de afirmar o princípio básico da separação dos poderes, a Carta Constitucional (ao contrário da Constituição de 1822 que retirou ao soberano grande parte dos seus poderes) voltou a dar ao Rei preponderância política: o poder executivo passa também por si e tem o poder de nomeação da Câmara Alta de Pares do Reino, podendo ainda destituir os Deputados eleitos pela Nação. A representação e a soberania nacional eram também privilégios do monarca.
Apesar de algumas alterações à Carta (e pelo meio uma outra experiência constitucional, em 1838), seria esta a Lei Fundamental que, até 1910, estipulava a organização jurídico-institucional do país.
Talvez a grande novidade presente na Carta tenha sido o surgimento de um quarto poder institucional: para além do legislativo (atribuído às Cortes), do executivo (governo e Rei) e do judicial (tribunais), o Rei-Soldado (como ficou conhecido D.Pedro) atribui à Coroa o poder moderador.
De inspiração francesa, segundo a Constituição de 1815 do Rei Burguês Luis XVIII, D.Pedro considerou a necessidade de uma vigilância das instituições: o Rei pode assim moderar e precaver eventuais falhas no funcionamento das instituições. Destituir as cortes, vetar as leis ou aconselhar o poder executivo passam a materializar, em substância, o tal quarto poder, o Poder Moderador.

Hoje em dia, apesar da inexistência de uma Monarquia, o Presidente da República, apesar das limitações constitucionais ao exercício dos seus poderes, ganha substancial poder quando é o único orgão de soberania que é eleito directamente pelas pessoas. Ao contrário do sistema representativo que nomeia o governo, parlamento e consequentes tribunais, o Presidente da República obedece ao critério directo da população.
As Constituições de 1911, de 1933 e de 1976 fizeram prevalecer, agora na figura do presidente, o poder moderador: atento ao funcionamento das instituições, o presidente da República pode intervir para desbloquear eventais abusos ou carências do sistema político.
Repare-se no recente papel de Cavaco Silva ao promover o debate entre os dois principais partidos acerca do orçamento de Estado. Assim como, há cerca de cinco anos, Jorge Sampaio destituiu a Assembleia da República convocando eleições antecipadas.
Como guardião da Lei Fundamental, o presidente pode promulgar ou vetar as leis, expondo eventuais casos bicudos para o Tribunal Constitucional e reunindo os seus conselheiros de Estado. 
Tal e qual como no Liberalismo Português do século XIX!
Este poder moderador confere ao presidente o estatuto de árbitro no xadrez da política.

Este post serve para limpar algumas dúvidas que a opinião pública menos esclarecida revela em vésperas de mais uma eleição presidencial: muitas das pessoas votam no seu candidato na esperança de que ele vá resolver os problemas estruturais do país. Ou melhor... do seu bolso...
O presidente não governa e acima de tudo deve assumir-se acima do jogo político-partidário.
Cavaco Silva, criticado pela sua pouca capacidade de intervenção, apenas fez o que a Constituição estabelece.

O apoio dos partidos a candidatos desprestigia a instituição, confundindo o eleitorado. Este foi um dos erros da 1ª República quando o Presidente era nomeado pelo Congresso (Parlamento) estando dependente sempre das maiorias parlamentares.
Tradicionalmente, qualquer presidente da República cumpre dois mandatos. Assim foi com Ramalho Eanes (1976-86), Mário Soares (1986-1996) e Jorge Sampaio (1996-2006) e Cavaco Silva não fugirá, de todo, à regra.
Não por mérito seu mas acima de tudo por uma falta de oposição credível. Manuel Alegre não se assumiria como candidato se não tivesse obtido o segundo lugar em 2006, à frente do candidato apoiado pelo PS, Mário Soares. 
Se naquela altura, não levou, por pouco, Cavaco a uma segunda ronda, Alegre erra , em 2011, ao conotar-se com o PS e com o Bloco de Esquerda. Se virmos bem, em teoria é Alegre o candidato do PS mas, na prática, não o é. 

Servirão estas eleições para determinar o funeral político de Manuel Alegre?

Manuel Alegre obteve o resultado esmagador de 2006 em parte devido à ausência de conotação partidária. À medida que a opinião pública portuguesa é cada vez mais atroz ao espectro partidário, as candidaturas independentes são privilegiadas pela sua componente de cruzada e sacrifício. Alegre, assumindo-se como o maior exemplo da luta contra o Fascismo e fundador do Portugal Democrático, opta por um discurso que em nada cola às massas. Homem da esquerda, defensor de valores e ideologias típicas da pura vertente social-democrata, Manuel Alegre deveria ter mantido a sua oposição a Sócrates. Na realidade, ser hoje em dia apoiado por Sócrates é derrota garantida
Se Alegre queria ganhar as presidenciais que ainda não perdeu, deveria ter, corajosamente, saído do PS , assumindo-se como independente. Pelo menos, poderia tornar a corrida a Belém mais emotiva!

Alegre está portanto entre a espada e a parede: por um lado é apoiado por um partido que, diariamente, perde popularidade e que de socialista tem apenas o nome. E ,face ao que Manuel Alegre apregoa, em nada se identifica na forma como  Sócrates vê o país. 
Por outro lado, Manuel Alegre tem pela frente o actual presidente da República. E se a tradição ainda contar para estas coisas, muito dificilmente impedirá  o segundo mandato de Cavaco.
Outro aspecto que condicionará Alegre deverá ser o constante ataque a Cavaco Silva! Apesar de o caso BPN merecer toda a atenção (pois joga com os contribuintes), Alegre poderia alargar os seus pólos de discussão para mostrar ao país o que pensa em relação a todos os dossiers
E não será proferindo um discurso ilusório e ultrapassado pois Alegre demonstra cada vez mais que não é um Homem destes Novos Tempos... poesias e epopeias foram chão que há muito já não dá uva...

Curiosidade em relação à candidatura de Fernando Nobre
Mais uma vez, voltamos a ter uma candidatura (a par de Defensor Moura) independente. Mas ao contrário de Alegre, em 2006, e Defensor Moura, em 2011, Fernando Nobre suscita o interesse pois é alguém que vem de fora dos bastidores da política. Um homem respeitado pela sua humanidade e, até ver, que granjeia de simpática opinião entre o eleitorado. Apelando ao voto fora da teia partidária tradicional, Fernando Nobre arrisca-se a ser um caso sério de popularidade. E acima de tudo mais um enorme cartão amarelo ao sistema político-partidário!
Longe das emotivas eleições de 1986, disputadas até à última por Freitas do Amaral e Mário Soares, estas serão talvez as menos interessantes e mais bafilentas eleições  presidenciais dos últimos 36 anos!

Apelo a todos os leitores deste blog para que dia 23 vão votar. Não se deixem dominar pelo triste senso comum do abstencionismo. Não votar significará a permanência ad eternum deste estado de coisas... 
Para isso existe o voto em branco que tem muita leitura política!

1 comentário:

Viagens Lacoste disse...

E o poder que o voto em branco tem em caso de 50% das preferências...