sexta-feira, 24 de julho de 2009

rasgar ou reciclar?


As recentes eleições europeias lançaram no seio do Portugal partidário uma série de estímulos quanto ao ciclo eleitoral que se avizinha a partir de finais do Verão. Apesar da fortíssima abstenção (que acerca da qual já me pronunciei), a derrota do PS por números esmagadores (segundo as análises de muitos politólogos) animou o PSD. Animou igualmente o CDS, preferindo os centristas concentrarem esforços no ataque aos centros de sondagens que, segundo as suas previsões, colocavam o partido de Paulo Portas bem longe do parlamento em Estrasburgo. Algo que se viria a declarar como profundamente erróneo. Segundo Portas, este mau trabalho por parte das sondagens poderia condicionar os votos de quem queria mesmo votar no CDS-PP. Como eternos vencedores, os comunistas conseguem permanecer como parasitas no seio de um parlamento dominado por ideologias completamente contrárias às suas. Também o Bloco de Esquerda consegue aumentar a sua participação europeia, colocando dois deputados no meio de tanto neoliberalismo! O PSD está assim convencido de que a maioria alcançada nas europeias será um sinónimo de vitória nas próximas legislativas. Ferreira Leite encontra um trampolim fortíssimo para um ano político que, segundo outros tantos politólogos, estaria a priori condenado ao fracasso. Há um ano atrás ninguém daria esta vantagem ao PSD, tendo muitos defendido a urgência de novos partidos dissidentes face ao descalabro que marcou as últimas lideranças laranjas desde a desistência de Durão Barroso em 2004. Até Alberto João Jardim recusa convidar a líder laranja para o célebre woodstock madeirense, o comício de Chão da Lagoa, por considerá-la como uma face perdedora.
Sócrates, quando confrontado com os mesmos resultados, admitiu algum desgaste da imagem do seu executivo, provocado por algumas políticas menos populares por ele tomadas. E como nestas coisas o marketing é que conta, o acessor para a imagem pública do nosso PM investe num extreme make over, explorando um lado mais "Madalena Arrependida" do líder dos socialistas. Marcante foi a entrevista por si dada à RTP ou à SIC (confesso que não me recordo), mostrando esta nova opção de retórica política. Com lágrimas nos olhos, Sócrates pôs de lado alguma da sua arrogância (que, confesso, para governar esta gente é, por vezes, necessária) e apresentou-se, não como um Kalimero, mas como que a pedir desculpa e compreensão pelas suas opções tantas vezes contrárias ao que havia pronunciado em campanha. Perante isto, temos um ano eleitoral bem quente.
Há um ano atrás, todos criticavam Ferreira Leite pela sua omissão relativamente a certos aspectos. Pelo seu desprezo pelos media, Ferreira Leite optava pelo silêncio. Os politólogos aí sentenciaram a sua morte política.
Com as Europeias no horizonte, Paulo Rangel confirma o talento proeminente já revelado no senado de S.Bento.
Indo de encontro às pessoas e aos seus reais problemas, o PSD optou por um contacto directo, tendo essa opção de campanha resultado que nem ginjas. Sócrates, fascinado pelo "Choque Tecnológico", atirou Vital Moreira às feras não ligando aos eventuais (que se confirmariam) resultados de uma candidatura infeliz marcada por infelizes citações que evidenciaram uma descoordenação entre o Partido e o cabeça-de-lista.

As questões são estas agora:

1ª Terá o PSD ganho as eleições? 2ª Ou terá antes sido o PS a perdê-las?
3º Há mérito de Ferreira Leite ou Rangel nesta vitória?
4ª Conseguirá o PSD resolver o assunto, sabendo que Rangel está lá algures na Europa?

Ferreira Leite não teria ganho as eleições sem o rosto e a frontalidade de Paulo Rangel. Ele é o verdadeiro rosto da vitória do PSD! E considero que Rangel fará falta a um eventual governo laranja. E se se mantiver a coerência de discurso quanto às tão discutidas (e hilariantes) duplas candidaturas, Rangel pouco poderá fazer lá longe, na Europa. Fazendo regressar Rangel poderá ser um atentado à tal visão transparente exigida por Ferreira Leite. Poucos acreditariam, há nem um ano atrás, nesta vitória. Mas muitos acreditariam num eventual desaire socialista. Se virmos bem, desde que foi eleito em 2005, Sócrates só tem conseguido desaires atrás de desaires nos sufrágios realizados (excluindo o referendo ao aborto que tem contornos que se medirão fora do âmbito ideológico): a derrota nas presidenciais, não para Cavaco, mas para Manuel Alegre; e agora as europeias. O adversário principal do PS não se encontra na oposição mas dentro do seio do próprio partido: as dissidências (que afinal de contas não são nada de novo) com Helena Roseta (em 2007 para a Câmara de Lisboa) e com Alegre, colocam o PS em estado de alerta. Se a isto aliarmos a má imagem que todos os dias é publicada nos media, o PS arrisca-se mesmo a ter de mudar a trouxa para a bancada da oposição. Apesar de tudo isto, considero que Sócrates é o melhor primeiro-ministro desde há muitos governos constitucionais. É arrogante. É dado aos esplendores de um (quase) culto da personalidade e adora modificar, segundo o que mais lhe convém, o teor das perguntas que lhe são colocadas. Ferreira Leite, sem explicar como, já estabeleceu os trâmites de uma sua eventual legislatura: limitar a intervenção do Estado; apoio às PME's dado a sua importância no fortalecimento do PIB e no garante de emprego; política orçamental rigorosa sem despesa pública que condicione o futuro financeiro do Tesouro. Inclusivé, Ferreira Leite já fala em "povo"! Substantivo que andava há muito ausente da oratória laranja! Sem explicar o modus operandis, Ferreira Leite já estipulou os objectivos. Como fazer? Logo se vê.... A política do "rasgar" já não pode colar. Em vez de rasgar, há que reciclar. Reciclar todo um país que teima em considerar a eterna crise como o pecado original. Um país em crise estrutural: todas as conjunturas assim se enquadram neste cenário. Um país com memória curta que já não se lembra da política da tanga; do aumento do IVA de 17 para 19% (minando assim as tais PME's pelas quais Ferreira Leite tanta preocupação demonstra); o Código do Trabalho de Bagão Félix (que serviria de base ao actual Código tão contestado) e a obcessão pelo défice. E isto já para não falar da política de defesa nacional (cujo Ministro Paulo Portas tão bem encabeçou...) com a compra dos tais submarinos que ainda vamos ter de pagar! E culminou tudo isto no abandono de Durão Barroso, na subida de Santana Lopes levando mesmo, na altura, Ferreira Leite (então a tal "Super-Ministra") a abandonar o novo (e à força) XVI Governo Constitucional, discordando daquele que agora apoia para o município lisboeta.

Se o PSD ganhar, será que isto vai melhorar? Será Sócrates o bode expiatório de um país constantemente em crise?
Mesmo se a crise terminar, deverá voltar tudo à antiga fórmula de entregar a Economia às livres pulsações do mercado? Se o PSD ganhar, iremos ter menos Estado Social?
Realmente, toda esta telenovela faz-me pensar acerca da necessidade de reciclar ou rasgar. Mais episódios se avizinham...

1 comentário:

Miss Kin disse...

Em resposta às tuas perguntas o PSD não ganhou, apenas manteve o que já tinha, os votos que eram do PS, continuaram na esquerda, mas desta vez na esquerda pequenina. Isto já te responde à 2ª e 3ª questões.
Qto à 4ª questão, não sei muito bem o que se passar nestas próximas legislativas e até tenho um pouco de medo, confesso, é que o que está não me parece bem ficar, mas Ferreira Leite também não me inspira modernidade nem resolução de problemas...

Acho que tens razão, o país está permanentemente em crise, começa-se por uma crise de valores e depois parte-se daí, para todos os postos.
Para haver melhoria tem que haver uma mudança a fundo nas mentalidades e mudanças a fundo nas políticas, mesmo que de início haja "mortos e feridos", é preciso destruir muita coisa e fazer de novo, porque isto do tapar buracos já não serve!