domingo, 6 de março de 2011

conquistar o ouro na vida

Poucos sabem mas desde meados de Fevereiro que acumulo horário, leccionando numa outra escola em Lisboa.
A Escola dos Mestres é uma pequena escola que oferece à população a oportunidade de conclusão do ensino secundário através de unidades capitalizáveis. Por isso, tendo alunos das mais diversas origens e idades, as minhas aulas nessa escola são, maioritariamente, em horário pós-laboral.

Da imensa diversidade de alunos, um deles me chamou à atenção na passada quarta-feira.
Um rapaz, dos seus vinte e poucos anos, entra na sala e, de forma cordial, cumprimenta-me. O rapaz chamava-se Luis. Disse-me que tinha um problema grave (notório) de visão e, no caso de eu escrever alguma coisa no quadro, pediu-me para que ditasse o que havia escrito.
Ele trouxe um portátil e era exímio e rápido na forma como escrevia o que eu dizia, assim como revelador de uma profunda autonomia, ao reter apontamentos pessoais.

A aula correu bem. Tentei sempre certificar-me que o Luis tinha tudo o que era necessário e fundamental.
No fim, cumprimentou-me novamente e agradeceu a aula e o meu auxílio.
Saiu.

Na 6ª feira, quando entrava para dar uma aula, reparei numa fotocópia que sobressaía destacada no painel das informações. Nessa fotocópia, uma fotografia de um atleta, vestido com as cores nacionais, ilustrava uma notícia que dizia que o atleta Luis Gonçalves, de 23 anos e portador de uma grave deficiência visual, tinha conquistado o ouro na corrida de 400 metros nos mundiais de atletismo na  Nova Zelândia. 
Para além disso, o Luis é medalha de prata olímpica na mesma modalidade (Pequim, 2008).


Na realidade, tudo isto me deixou surpreendido mas, ao mesmo tempo, feliz por saber que o ser humano ainda tem um lado que consegue vencer tudo e todas as crises...
O Luis revelou-me o outro lado, com que eu não estava habituado a lidar. É um exemplo de vontade...
Parabéns, verdadeiro campeão! É um orgulho poder ajudá-lo a conseguir o ouro na vida...

terça-feira, 1 de março de 2011

melhores 10 álbuns dos 90's (parte I)

Estas listas valem o que valem. Por si só apenas...
Mas, olhando para esta lista que mostra a opinião dos leitores da Rolling Stone acerca dos 10 melhores álbuns dos anos 90, podemos concluir que esta foi também uma enormíssima década de ouro. Faltarão alguns discos, sem dúvida. Mas, olhando para estes 10 álbuns, reparo que todos eles fazem parte da minha colecção. E isso não deixa de ser significativo.
Aí vai a minha opinião acerca dos primeiros cinco discos.

1. Nevermind, Nirvana (1991)

Gostemos ou não de Kurt Cobain e da sua música (considerada por muitos como sendo decadente e excessivamente surreal em termos líricos), o álbum de 1991 marcou uma viragem na música popular. Acima de tudo, trouxe ao de cima que o mais insignificante membro da sociedade tem raiva dentro de si e a música ganha, por isso, um novo sentido na forma como se comunica.
Sem dúvida, este disco reúne aquele que continuará a ecoar como o hino da juventude dos 90's: Smells like teen spirit... uma ode à rebelião e à impetuosidade juvenil.
Guitarras no limiar do feedback e uma secção rítmica avassaladora  endureciam o complexo imaginário do universo lírico do malogrado Kurt Cobain...
Este disco teve a força de abafar por completo a estética glamorosa em que o rock americano definhava na viragem para a última década do século XX... A partir de Nevermind, o rock nunca mais seria o mesmo... Intocável!  Conseguem imaginar Cobain vivo,ainda hoje?


2. OK Computer, Radiohead (1997)

Tive o privilégio de, em Julho de 1997, assistir no Paradise Garage à apresentação deste disco que, avaliando pelo escasso público que nesse dia acorreu à sala lisboeta, poderia ser apenas e só mais um disco da banda britânica. 
Ao invés disto, recordo tudo aquilo que me passou pela cabeça no fim desse espetáculo: a imensidão sonora e profundidade que OK Computer revelava. Comprei o disco e, após cuidada audição, vi que estava ali uma espécie de Sergeant Peppers em plenos anos 90. Os Radiohead adivinharam o futuro: o domínio da tecnologia sobre o Homem... sem cair na mera crítica, Thom Yorke projectava a Humanidade a rumar ao autismo do conforto tecnológico. Como é que se traduz tudo isto em linguagem musical? Guitarras que ecoam... ritmos desconcertantes e utilização de samples e demais padrões sonoros, conferindo a este disco o epíteto de clássico inovador...
Li algures que Paranoid Android poderia ser muito bem a Bohemian Raphsody dos 90's. Elogio ou não, a verdade é que, um mês após o lançamento deste álbum e dos concertos de apresentação realizados em Lisboa, OK Computer é destacado como uma das novas maravilhas do mundo... houve quem afirmasse que, desde o citado disco dos Beatles de 1967, não havia surgido algo semelhante. Após OK Computer, tantas foram as bandas e artistas que adoptaram o apadrinhamento deste disco... Notável!

3. Ten, Pearl Jam (1991)

Que bela colheita, a deste ano da Graça de Nosso Senhor de 1991!
Eddie Vedder e companhia mostra a nova faceta da moderna banda rock! Conterrâneos dos Nirvana, os Pearl Jam destacaram-se imediatamente pela inconfundível voz do seu cantor. A temática das letras roça entre o pesadelo e a catarse emocional. Em Jeremy, Vedder denuncia histórias que antes ninguém ousava cantar... a solidão...o desespero... a libertação com que atinge o epílogo do álbum (Release). Musicalmente, Ten obedece e celebra as influências americanas dos membros dos PJ: desde Hendrix ao trovadorismo de Neil Young ou Bob Dylan, o som dos PJ ganha em Ten um cariz próprio, muito por culpa de Vedder ,que se assume como a nova imagem do frontman de uma banda de rock... Para ouvir aos altos berros, de camisa de flanela, botas e calções da tropa... Mítico!

4. Achtung Baby, U2 (1991)

Os U2, no final dos anos oitenta, já tinham feito tudo aquilo que podiam fazer. Eram a banda que enchia estádios em todo o mundo e os seus discos vendiam que nem ginjas por toda a parte. Após "Unforgetable Fire" (1984) e, sobretudo, "The Joshua Tree" (1987), as canções dos irlandeses enfatizavam as multidões. Gostar dos U2 nessa altura era ser cool. Bono era o frontman por excelência, capaz de levar ao rubro milhares e milhares de pessoas dentro de um gigantesco estádio. Oriundos de um país tradicionalmente periférico, os U2 conquistaram a América e todo o globo, havendo quem afirmasse que o estatuto dos Beatles parecia estar ameaçado. 
Como disse Bono em 1990, cabia aos U2 deitarem abaixo a àrvore de Joshua. Em 1990, os U2 encontram-se numa biforcação: ou acabam como banda, ou então mudam... completamente.
Com a América aos seus pés, Bono e Cª seguem o caminho menos óbvio. Em vez de voltarem a gravar nos Estados Unidos, os U2 vão para a então recém reunificada Alemanha procurar um novo sentido para a banda. Talvez a euforia da queda do muro pudesse trazer algo de novo a uns U2 que, na altura, se encontravam numa profunda letargia criativa
Em conjunto com a dupla Eno & Lanois, os U2 ocupam os antigos estúdios Hansa by the wall e aí, onde Bowie havia gravado a trilogia berlinense nos anos 70, e ao som da reconstrução da indústria e da sociedade alemã,  começam a gravar aquele que seria, para muitos, o melhor álbum dos irlandeses. E um dos mais importantes trabalhos discográficos da História da Música!
Quem assistiu àquelas sessões em Berlim, conta que foram as mais impressionantes jornadas criativas dos últimos 25 anos. Exagero ou não, Achtung Baby traz um novo som aos U2: influenciados pelos períodos berlinenses de David Bowie e Lou Reed, Bono canta em timbre industrial, com a sua voz no auge e amargurada pela chegada à idade dos trintas. O seu universo poético atravessa a própria cidade de Berlim e as vivências e decadências de alguém que  procurava livrar-se de fantasmas e angústias passados. The Edge leva a sua guitarra a dimensões nunca antes visitadas, achando o novo som dos U2 que tanto procurava. A própria vida pessoal da banda não passava a melhor fase: divórcios, separações e tensões internas  serviriam como força criativa para a produção de um disco tão perfeito. 
Em Novembro de 1991, Achtung Baby choca o fã tradicional dos U2. Lembro-me que não foi fácil pois ninguém estava preparado para o que ali estava. Como qualquer disco superior, havia que digeri-lo bem... e calmamente. 
Se The Fly apresentou a nova fase da carreira dos U2, One revelaria a unidade/união que a banda procurava. Numa cidade também agora unificada. Histórico!

5. What's the story (Morning glory), Oasis (1995)

Adorados por muitos e odiados por tantos outros, os Oasis assumiram sem preconceito a admiração pelos Fab Four de Liverpool. Se nos EUA eram os discos produzidos em Seatlle a ocupar os tops, em Inglaterra eclode a guerra civil entre os Oasis e os Blur. Ficou conhecida esta época como a era da Brit Pop. Mais crus e conservadores que os rivais londrinos, os irmãos Gallagher conseguiram neste álbum um autêntico manual de como fazer canções simples que soam a hinos grandiosos: Wonderwall, Don't look back in anger, Roll with it ou Champagne Supernova são ainda hoje canções que não passam com indiferença. Bono, dos U2, terá dito que a canção que mais gostava de ter composto era, talvez, Wonderwall...
Gosto dos Oasis e deste disco, embora seja mais entusiasta pelo primeiro Definitelly Maybe (1994) e pela última fase da banda...
Mas é sem dúvida um disco eterno! Goste-se ou odeie-se!

(Continua)