segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

as espirais labirínticas da arte de julgar

Penso que um dos males (senão o maior) do nosso país reside na falta de transparência.
Transparência essa que deveria constituir pedra basilar de um estado que se afirma como democrático. Transparência como condição sine qua non para que realmente um cidadão se sinta integrado e respeitado no seio da sua comunidade.
As leis devem ser claras e não obedecer a espirais maquiavélicas de subterfúgios jurídicos que permitem a que poucos (por uma condição de posse económica) consigam eternizar processos, apoiados em normas judiciais e num código de processo penal lento e ineficaz.
Há dias conversava com um amigo meu que trabalha na área jurídica de uma empresa. Formado em Direito, ele é também advogado pertencente à Ordem, embora não exercendo diretamente a profissão.
Ele falou-me que a justiça tem de ser justa. Isto é, em termos consuetudinários (segundo as tradições de uma sociedade), condenar injustamente é mais complicado do que ilibar, de forma injusta, um arguido.

Realmente, por outras palavras, ouvi ali alguém que percebe do assunto me afirmar que a lei, num Estado de Direito, serve para proteger o bandido (como reza o vernáculo popular) ao invés de defender a vítima.
Julgar não é fácil em democracia. Não nos devemos tornar monstros de forma a combater um monstro. Penso que a lei deve ser clara e evidente, acessível a todos e que seja aplicada com racionalidade. Assim se defende desde Montesquieu e desde a aplicação da Lei da Boa Razão, no postulado pombalino.
O principal problema de um país está sempre na forma como o cidadão olha para a justiça. A inacessibilidade e a burocracia que a envolve enfraquece o devir democrático. Cria perigosa ansiedade e suspeição em seu redor. As provedorias em Portugal são inacessíveis. Os agentes reguladores são meros verbos de encher. E falo por mim que, há cerca de um ano, aguardo um comentário/resposta a uma queixa apresentada ao INCI a respeito de um problema de construção que na minha casa. 

Perante este panorama de anomismo e vazio no acesso à justiça, aparecem os chavões do populismo (que até merecem alguma razão): "Justiça para ricos e justiça para pobres"; "fazer justiça pelas próprias mãos"; "O Ministério da Justiça cria mais injustiça do que justiça".

O poder legislativo, do qual somos todos soberanos, é sinuoso. O legislador, não obstante a ingratidão da sua função, não aparenta qualidade. A lei observa demasiadas exceções que perfilham labirintos legais que permitem a perenização dos processos. O nosso sistema processual é pouco (ou nada) eficaz. Amontoam-se processos. Volta-se atrás e nunca à frente. Prescrições atrás de prescrições. E a ideia da injustiça fortalece-se na opinião pública.

Se calhar o Direito europeu é demasiado conservador. Deveria olhar mais para o anglosaxónico. Talvez. Esta é a discussão que para a qual não me sinto academicamente preparado. Mas a minha visão mantém-se e agrava-se relativamente ao assunto da justiça: fraca, inexistente e incipiente. E se queremos melhor e mais democracia, este seria um setor por onde mais se deveria olhar...

O memorando de entendimento com a TROIKA pressupõe a reorganização do sistema judiciário e a desburocratização da Justiça. Recentemente, a Ministra Paula Teixeira da Cruz afirmou, em abertura do ano judicial, a necessidade de acabar com o dogma da justiça injusta em Portugal. Propõe reformas. Aguardemos. Porque os romanos sempre olharam para uma justiça que não olhasse a classes... (ver imagem)



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